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Black Dog


tags: Mauro Tomaz Categorias: Opinião quarta, 30 outubro 2019

Resiliência é a capacidade do indivíduo para lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de conjunturas adversas. Em situações particularmente difíceis de crise, seja de que tipo for, torna-se necessário aprender a estimular a nossa capacidade de dar a volta às circunstâncias desfavoráveis que nos desequilibram e criam uma espécie de ansiedade que, quando levada ao extremo, pode tornar-se incontrolável e mesmo incapacitante. O risco do colapso é inerente à natureza do ser, mas é sempre possível reagir a tudo através da atitude que se adopta perante a realidade que nos habita. Portugal é o quinto país da União Europeia com mais casos de doenças mentais, sendo a ansiedade e a depressão os problemas mais comuns, segundo dados que constam do relatório “Health at a Glace”, divulgado pela OCDE. O que fazer para superar os dias sombrios?

 

O grande problema é quando a angústia e o completo desespero se apoderam por inteiro do indivíduo, minando-lhe a sua natural alegria. Na sua forma mais extremada, este deixa inclusivamente de ter dias bons, perde o prazer em tudo o que fazia e deixa de dominar o transtorno que o preenche, entrando “em depressão”. Os obstáculos fazem parte da vida, mas nem todos os conseguem enfrentar da mesma forma, sendo que uns conseguem ter o poder de relativizar com alguma facilidade situações adversas várias, que para outros acabam por se revelar autênticas montanhas inultrapassáveis. A realidade custa tanto a encarar que o desalento apodera-se do indivíduo, anestesiando-o. Há alturas em que temos obrigatoriamente de “arregaçar as mangas” e agir, mantendo a cabeça fria o suficiente para evitar o desmoronar da nossa estrutura psicológica, que tanto pode ser feita do material mais resistente como da mais vulnerável película. Filosofias de vida, cada um tem a sua, mas há sempre determinadas premissas que nos podem ajudar a manter a cabeça fria e a ter uma atitude mais positiva perante a própria existência e a dos que nos rodeiam. A capacidade de resistir é passível de ser aprendida, pois a resiliência do indivíduo reside na sua atitude. Desenvolver uma postura optimista previne eventuais perturbações de carácter, por isso o melhor é mesmo seguir o caminho do brio pessoal, cultivando corpo e mente. A consciência de cada um é a melhor monitorização que pode haver sobre tudo o que temos de bom e de mau também. Logo, importa valorizar os pontos fortes que possuímos, relativizando os mais fracos e lutando inclusivamente para aligeirar ou mesmo evitar por completo hábitos nocivos que façam parte do nosso dia-a-dia. Apesar de ter o seu lado enriquecedor, a solidão muitas vezes não é boa conselheira, por isso nada como fortalecer os laços que existem com os familiares e os amigos mais próximos, pois o bom convívio é sempre restaurador. A prática de exercício físico é determinante, dado que além de extremamente saudável acaba por produzir a libertação de químicos cerebrais que actuam directamente no humor e na robustez psicológica, além de ter um papel decisivo no combate ao stress. Quando tudo à nossa volta parece estar virado do avesso, nada como pegar num livro de qualidade e ler algumas passagens, cultivando a própria espiritualidade e definindo assim de forma mais arguta a nossa própria filosofia, ou o que fazemos neste mundo. Há autores que são excelentes companheiros, nos momentos mais difíceis. 

 

É importante estar activo e interventivo, manter a cabeça ocupada e saber ter a frieza necessária para não ceder ao desencanto, à mágoa e à raiva que situações diversas poderão potenciar. Por outro lado, a procura da boa disposição é meio caminho andado para o bem-estar, mantendo o coração a uma temperatura que permita acolher todas as boas sensações exteriores, sendo que para isso por vezes basta um simples sorriso. Ter um bom “karma” ajuda e muito a estarmos bem connosco e com os que nos rodeiam. Apesar de haver diferentes “sortes” no decorrer do percurso de cada um, o “savoir être” quando levamos um valente “abanão” nas nossas vidas varia de pessoa para pessoa, daí parecer-me extraordinária, e até mesmo brilhante, a boa capacidade de relativização do indivíduo. Não temos uma só vida? Passa tudo tão depressa, o que é mesmo o Tempo? O caminho do martírio é um verdadeiro desperdício de vitalidade, daí a importância da atitude. Uma forma de estar positiva e confiante é conducente à Luz, o oposto leva-nos inevitavelmente ao adensar do negrume. Que caminho seguir? O óbvio! Há que viver com o que se tem... não com o que se teve e, entretanto, perdeu, mas sim com o foco bem colocado no que ainda se pode ganhar. O ser humano tem uma capacidade fantástica para se adaptar às condições mais desfavoráveis e mais extremas, basta procurá-la e explorá-la ao máximo. Está tudo na cabeça de cada um. 

 

Winston Churchill, um histórico resistente à adversidade e também fiel adepto de poesia, metaforizava a “nuvem negra” do desalento que volta e meia o perseguia como um “black dog”. Para ele, a depressão não passava de um cão que pode “morder” de vez em quando, mas que lá no fundo é sempre “domesticável”.