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O CAMINHO DE FERRO EM PORTUGAL -Linha da Beira Alta- A estação da Pampilhosa (continuação)


tags: Alice Godinho Rodrigues Categorias: Opinião sexta, 29 novembro 2019

Em 1882, na estação da Pampilhosa , num poste bastante alto ondulavam ao vento duas bandeiras azuis e brancas. À direita lia-se LIGNE DE BEIRA ALTA; à esquerda LIGNE DE FIGUEIRA; por baixo, outra tabuleta onde se lia SECTION DE CANTANHEDE.

As distâncias encurtam-se; relativiza-se a noção de espaço e de tempo, encontram-se pessoas diversas, eliminam -se muitos atrasos culturais, contacta-se frequentemente com novos ideais.

Eça de Queiroz descreve o entusiasmo com que eram recebidos os caixotes trazidos pelo comboio com livros de Michelet, Victor Hugo, Renan, Proudhon, Comte, Hegel, Flaubert e outros. Recordando A cidade e as Serras, encontramos uma das mais belas criações de uma viagem de caminho de ferro, com fina ironia, uma das grandes características da sua prosa. Em Coimbra a geração de Eça, Antero de Quental e outros devem parte da sua formação cultural à rapidez com que o comboio transportava do estrangeiro as novidades literárias, filosóficas e políticas.

Na Pampilhosa, surgiu a Livraria Bertrand, onde eram vendidas essas publicações. Tinha como funcionária principal Virgínia Gonçalves da Cruz. Era uma pampilhosense, filha de uma emigrante francesa e era casada com António Gomes da Cruz, natural de Mealhada.

Quando D. Carlos aparecia por estas bandas, rumo à Beira Alta, almoçava no Restaurante da Pampilhosa, onde era cozinheiro António Gomes da Cruz. D. Carlos, agradecia-lhe com a oferta de moedas em ouro, que tinham o desenho da sua efígie.

Referimos também o começo do turismo nesta altura. A estação passa a ser um grande centro de difusão turística. Aí se encontravam cartazes, pequenos folhetos sobre serviços de comunicação, preços de viagem, excursões, referências a hotéis com fotografias e tabelas de preço. A partir dos anos vinte, a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses passou a ter um funcionário destinado ao turismo.

Começam a surgir os locais de lazer: praias e termas. Com a inauguração do ramal Pampilhosa-Figueira (1882) aparecem na Praia da Claridade, Figueira da Foz, os veraneantes da Beira Interior. Os mais afortunados habitam nos Challets do Bairro Novo, utilizam um estilo afrancesado, animando a estação da Pampilhosa, fazendo com que esta se anime com a vinda das moçoilas casadoiras a apreciar as novas modas. Com a viragem do século chegam os espanhóis em grande número. Obedecem ao serviço combinado entre Medina del Campo, Cantalapiedra, Salamanca e Vilar Formoso, no entanto, os locais mais preferidos pelas elites eram as Termas. A poucos quilómetros da Pampilhosa tínhamos as Termas do Luso, Alcafache, S. Gemil, Caldas da Felgueira. Eram frequentadas sobretudo pela alta burguesia e aristocracia. Apresentamos alguns representantes destes grupos: o Conde de Burnay - L'habitué das Termas do Luso- oriundo de uma família belga com tradições no ramo bancário. Era considerado o homem mais rico do país, participando em numerosas empresas ligadas aos tabacos, ao vidro, à indústria química e fora um dos dirigentes da Companhia dos Caminhos de Ferro da Beira Alta.

Competiam estas termas, situadas a partir da Pampilhosa, com centros termais estrangeiros: Vichy, Cauterets ( França)- Baden-Baden ( Alemanha), Cestona ( Espanha) e outras.

(Continua)