Diretor: 
João Pega
Periodicidade: 
Diária

"Como a Democracia pode ser vilipendiada"


quarta, 06 março 2024

Democracia é o sistema em que a vontade do povo livremente expressa se reflete no funcionamento dos órgãos de poder. Estes têm a obrigação de governar com o povo para assegurar o interesse público. Para identificar a Democracia bastam três substantivos: "Liberdade, Igualdade, Fraternidade", invocados, pela primeira vez, durante a Revolução Francesa. Cinquenta anos depois de termos conseguido esta importante conquista, a experiência diz-nos que adjetivá-la não é um bom presságio. Há uma casta política (dois partidos em alternância) que sequestrou o poder e faz dele o que bem entende – desde que respeite as oligarquias económico-financeiras, promovendo a manutenção de um clima de compadrios e de falta de exigência.

Assim chegámos “ao estado a que chegámos”: esta estranha crise política e social que os portugueses vão ter que resolver, sem nunca esquecer ou fazer por desmerecer as conquistas de Abril. De facto, não temos um regime perfeito, pelo contrário está cheio de incoerências e vigarices, mas a evolução faz-se no sentido do futuro, não do passado. Temos de melhorar, em desenvolvimento económico, em justiça social, em serviço aos cidadãos, as conquistas do 25 de Abril. E melhorar é nossa responsabilidade e das novas gerações.

Nestes tempos sombrios, não será motivo de admiração que as sondagens mostrem a descida eleitoral dos partidos tradicionais e a subida de outras forças mais demagógicas. Perante esta crise, o empobrecimento e a insatisfação das pessoas, encontram, no ideário que promete abanar o sistema e que aponta aparentes inimigos e culpados para os infortúnios, um discurso aparentemente com sentido. Mas que é um engodo. Este tipo de políticos gosta de arranjar bodes expiatórias para esconder a sua inépcia e falta de honestidade, e que normalmente são os imigrantes e as minorias. A lista está mais do que elencada.

Votar no partido deixou de representar pertença a um pequeno nicho ideológico. O mal já está feito. O povo português está a cair como um patinho na esparrela da demagogia total de um partido – de um homem só – pois à roda dele apenas gravitam rostos sem expressão ou alguns com os indisfarçáveis sinais da inveja dos medíocres, quando não mesmo de perturbação mental. E algumas das pessoas de relevo pertenceram à milícia de Salazar e ao MDLP (movimento terrorista), apoiando um partido à sua medida, totalmente incoerente nas propostas, propagando um ideário discriminatório, racista e xenófobo, chegando ao ponto de resgatar gestos e símbolos nazis. Um partido que já deveria ter sido ilegalizado, e há muito, pois a Lei prevê a extinção dos partidos políticos que difundam mensagem desse teor.

E o problema não é só a personagem e os que partilham o palco, são todos aqueles que o sustentam, umas quantas figuras sinistras do fascismo que nunca desapareceram, apenas não encontraram, desde então, representação à altura. E, também, os descontentes, os injustiçados, os desavisados e todos aqueles que já frequentaram a escola em liberdade, mas o que aprenderam não chegou para perceberem como é perigoso ser apanhado no jugo de uma ditadura de “pessoas de bem”. Esta gente que ajuda aqueles que os irão oprimir precisa de entender o engodo. E essa mensagem não é fácil de fazer entender, mas tem de ser dita. Calar, ignorar. Nunca. Qualquer pessoa que não se oblitere ao exercício do pensamento consegue perceber que o partido não tem propostas para melhorar a vida dos portugueses. Mas quem tem a intenção de fazer essa escolha de voto abdicou dessa análise crítica. Está simplesmente entregue a um estado emocional e à fantasia que a personagem apregoa com astúcia digna de um vendedor de banha da cobra.

O método é infalível: apresentar soluções simples para problemas complexos. Pôr a pensão mínima de reforma igual ao salário mínimo e financiar isso com dinheiros europeus ou lucros do “combate à corrupção”, sendo que é ilegal, de acordo com as regras comunitárias, utilizar os fundos da EU para esse efeito; dar a todas as forças de segurança um subsídio de risco equivalente aos operacionais da PJ e pagá-lo com a poupança feita no combate à “ideo­logia de género”, que seguramente não dá para 10%  dessa despesa, para não entrar noutras questões, como o facto de ter uma deputada que acha que as mulheres devem estar em casa a coser meias; terminar com os subsídio-dependentes, mas, ao mesmo tempo, pagar promoções retroativas a toda a Função Pública que o reclamar. E seguindo estas proposta é só ganhar as eleições, fazer limpeza/desinfestação de que o País precisa. Contudo, não disse, ainda, onde é que foi descoberto o poço de petróleo ou a mina de diamantes que permitirá fazer face às despesas que tais medidas implicariam.

É da história: os que aproveitam a liberdade que desprezam, para espalhar o ódio são sempre os primeiros a querer tirá-la a quem os contesta. O vírus autoritário não nasce só no Estado. Está ativo na sociedade, pronto para contaminar tudo e todos. E deverá servir como lembrete do passado, como alguém já disse – “a pior democracia é preferível à melhor das ditaduras.

Marília Alves

Técnica Superior na Direção Geral de Reinserção Social e Serviços Prisionais