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Artigo de Opinião: Mãe! E o 25 de Abril


Categorias: Opinião quarta, 24 abril 2024

Perguntem quem era uma velhinha minha mãe! Que, do nada que tinha, tudo dava, nem que fosse, tão somente, uma simples lágrima! Sempre de coração doído, pelos que ainda eram mais pobres do que ela.

            Eu sei que onde estás, minha amiga, é lá longe, onde brilham as estrelas. Eu sei, que é aquele lugar de recompensa, que a tua fé te descrevia, como sendo incrivelmente belo e sereno, onde existe a bondade, o carinho, o amor pelo próximo, a bem-aventurança para todas as almas com um coração de oiro como o teu.

            Ainda hoje me lacrimejam os olhos, pela tua ausência. Choro! Como choram todos aqueles que tiveram mãe, como a que eu tive, sempre ao meu lado, nos meus dias mais sombrios, mais frios, mais tristonhos.

            Tenho bem presente aquela manhã, bem cedo, de Abril, dia do teu aniversário, em que finalmente os algozes estavam a ser corridos, e tu, sempre uma alma aflita, com respiração arquejante, me deste a saber o que ouviras na rádio durante a madrugada.

            Disseste-me, com toda a fé, que era a melhor prenda de anos que te podiam dar e a esperança, que logo ali depositámos, num novo país, governado por gente sã, de pensamentos escorreitos, com princípios de igualdade, dignidade, humanidade.

            Aconselhavas-me a esquecer os percalços, os maus momentos, a vida arrastada, na ditadura fascista, que o tempo tudo curava.

            Pois bem! Deixa-me que te diga: O tempo só cura, só cicatriza as feridas, quando as coisas ruins não voltam a acontecer.

            Mas muitas estão de volta, embora mascaradas, ao fazerem-nos crer que estamos numa sociedade democrática, uma sociedade livre, uma sociedade, direi mesmo, fraterna.

            Que raio de democracia é esta, onde muitas famílias, a trabalharem para cumprirem os seus compromissos, chegando a tirar à barriga o seu sustento e que sofrem o pesadelo da miséria, de um momento para o outro são despejadas das suas casas, dos seus bens, a favor dos exploradores implacáveis dos bancos, com o consentimento dos governos.

            Famílias envergonhadas a pedirem auxílio às instituições de caridade, com vencimentos de miséria, que não chegam para fazer face ao aumento brutal das rendas  e de todos os bens essenciais à vida.

            Estima-se que ultrapassa os dois milhões, as pessoas que estão à beira da miséria. Outros a estenderem a mão à caridade e a pernoitarem pelos recantos das cidades e ainda com o rótulo de vadios, velhos a serem encontrados sozinhos, abandonados e muitos já com a alma no outro mundo. Falências, êxodo dos mais novos, justiça para pobre e outra para os bem posicionados e o rol, infelizmente, não fica por aqui.

            Como queres tu, que o tempo me varra do pensamento tudo por quanto passámos e que sempre acreditei não mais voltar?

            Como vou livrar os meus netos e bisnetos deste atoleiro, quando eu próprio enganei os meus filhos prometendo-lhes um País onde todos iriam ter a sua oportunidade?

            Prometi-lhes, porque sempre acreditei!

            Tudo o que de mal, acontece neste nosso Portugal, é por causa da ganância dos poderosos, sem escrúpulos, sem decência que, quanto mais têm, mais querem, e o pé rapado que se lixe.  

            Conheces as ervas daninhas, aquelas que maltratam e atrofiam as sementeiras e que, por mais que se tente arrancá-las, ficam lá sempre raízes, que dão mais tarde novas ervas daninhas, pois é tal e qual isso que continua a acontecer, com esta praga de gente, que não quer, de maneira nenhuma, abdicar dos tempos da ditadura Salazarenta.

            E este pobre povo, que merece justeza e todos os outros atributos duma sociedade livre, voltou à frieza do passado, embora se manifeste em tom de desabafo, porque dizem que estamos em democracia e têm esse direito.