A epidemia dos partidos
A República sofre da endémica doença de entregar os interesses do país aos interesses do partido mais votado no confronto eleitoral. Não se procura o cidadão mais apto e competente para governar a República, mas sim os que, na pirâmide da clientela cartonada, mais retórica gastam na sua promoção, começando nos coladores de cartazes, gente tão útil no período eleitoral como nos gabinetes dos ministérios atuais. Aconteceu na primeira experiência republicana depois de 1910, e acontece nesta terceira experiência, na sequência do pós 25 Abril com a queda da ditadura de Oliveira Salazar. Este terceiro ciclo, criado no ciclo abrilino desta segunda hipótese, tem sido uma corrida vinda do velho conservadorismo, agora baseada em anti interesses nacionais, favoráveis em primeiro lugar a clientelas que substituíram os conhecidos tachos ou ganchos da tão criticada ditadura após 28 maio de 1926 com o partido único, a União Nacional. Curiosamente, com o abril de 74 e as promessas de um Portugal feliz, o português assistiu à venda das melhores empresas nacionais ao estrangeiro, à delapidação secreta das reservas de ouro depositadas nos bancos de Portugal e da Inglaterra, ao fim conturbado da guerra colonial com o precipitado regresso de milhares de portugueses, com o fim da marinha mercante e da frota pesqueira, com a extinção dos polos industriais da margem sul do rio Tejo. Seguindo o raciocínio de Eduardo Lourenço, as revoluções em Portugal fazem-se para ficar tudo na mesma, e de facto não se pode dar ao nosso filosofo senão inteira razão.
Com a entrada na CEE e a assunção de uma divida publica incomportável para os cofres da nação, a divida tem sido habilidosamente destilada entre o valor do pib, as verbas mendigadas na comunidade, os fundos de alguns aposentados e aos quatro milhões de portugueses nos limites da pobreza material e cultural. Ao contrário das promessas e dos sonhos que abril gerou, o país mantém-se nos últimos lugares da escala de rendimentos dos paises europeus, incluindo os países oriundos do Leste. Os Donos Disto Tudo, como muito bem glosou a televisão nacional num seu programa, afundaram a nau da última esperança, mantendo a amargura do povo no porão das caravelas que se afundaram nos mares da descolonização.
As oportunidades, cumprindo a tradição do cravo, da canela, da pimenta e do ouro , mandaram mais uma vez o povo às favas , continuando o português a ser o mesmo e eterno emigrante, agora com algumas novas malas de cartão, ao abrigo dum surto de melhor educação, atrativos aos mercado do trabalho europeu e não só , educandos que o próprio governo de Lisboa publicamente incitou a procurar emprego fora da pátria mãe, num deprimente gesto de abandono do jovem cidadão, perante o descalabro da débil economia e a entrada do fundo monetário a segurar as calças pelas últimas presilhas…
A debandada foi geral, perante as políticas miserabilistas dos curiosos amadores da gestão política do país, hoje, como sempre, apostados no improviso à margem de planeamento, de programação, de objetivo, de ambição, de seriedade política e Sentido de Estado, um sentimento que o sucessivo poder escamoteia.
Neste vegetar daquilo a que chamam política, o circo está montado, a educação aos empurrões, a saúde em descalabro, a habitação inacessível ao português comum, os impostos dos mais pesados da Europa, os rendimentos no fundo da mesma, o custo de vida alto, as televisões um alfobre de cultura balofa e pirosa que se julgava ultrapassada, enquanto as forças concorrentes ao próximo ato eleitoral se digladiam em banalidades e fraquezas pessoais na praça da ribeira do costume, deixando de fora os verdadeiros interesses e problemas de uma nação, em favor da peixeirada geral em conjunto com alegres campanhas de medíocre desiderato ! Apetece sugerir que a criançada desceu ao Terreiro do Paço onde tudo acontece no remanso de compadres.
Não se prepara o amanhã para a comunidade atual e futura, mas sim para a vasta clientela que parece aguardar no mesmo tacho salazarento a sorte e a ventura de um cartão de emprego, virtual e mensalmente adquirido das hostes respetivas, uma União Nacional.
Algo que está longe do desenvolvimento necessário, do crescimento devidamente planeado e cumprido com fins bem determinados, com conhecimento, sabedoria e ambição que motive e proporcione um atingir dos fins, que exigem igualmente um acompanhamento rigoroso capaz de fazer diminuir as estatísticas europeias da corrupção em Portugal, muito mal posicionada a nível europeu.
Depois, em termos económicos é legitimo perguntar se é prioritário um colossal investimento no TGV Lisboa Porto, em pontes e aeroportos que vão servir a mesma gente nos territórios de sempre. No resto do país o cidadão, pagando os mesmos impostos, é outro, é de segunda para que a matriarca lisbonense disponha de grandes investimentos.
A chupeta oficial continua agarrada aos mesmos conservadores do Terreiro do Paço sempre a apostar no mesmo número e nas mesmas aptidões que esboroam o resto da nação. A nossa prioridade devia estar centrada numa ferrovia rápida para o centro europeu, capaz de integrar a nossa economia nos contextos continentais com maior rapidez, dando-lhe ao mesmo tempo competitividade igual aos produtores do centro da Europa. O que se está a passar na linha da Beira Alta até á fronteira, é uma patetice tacanha e inútil. Após os milhões de euros gastos num dito melhoramento da via, vai ficar tudo na mesma, ou seja, os comboios portugueses continuarão a terminar a viagem na raia de Vilar Formoso por diferenciação de bitola. Afinal nem mais nem menos que a mesma bitola dos fogos anuais que este ano consumiu largas fatias do norte do país que há dezenas de anos precisa de rigoroso ordenamento do território e nada foi feito para remediar o mal.
O tempo destas evidências perante os apoios da comunidade tem anos, os mesmos anos que a vizinha Espanha utilizou para alterar a sua rede ferroviária, utilizando o apoio dos fundos europeus até ao esgotamento, com a construção de uma rede de bitola europeia que galga os Pirenéus e entra na Europa.
Nós, portugueses, babamo-nos com tricas de trazer por casa e arremedos de importância geral tentando calar canetas com rolhas de vinho azedo.