E se inventarmos uma profissão?
Se não gosto, critico. Se não me aquece nem me arrefece, tenho o direito de mandar uma graçola. Se até gosto, fecho-me em sete copas e acaba ali o assunto. E quem se atrever a tecer um elogio, meus caros, é certinho e direitinho de que está feito com “eles” - uma entidade semi-mítica que ninguém sabe bem definir.
Um tempo estranho. Marcado pela crítica gratuita. Pela insatisfação generalizada. Pelo culto do ódio. Internet e redes sociais, perdoem-me, mas a culpa também é vossa: tornaram-se o palco do descontentamento. Nos dias que vivemos, é muitas vezes atrás de um ecrã que as pessoas se sentem mais à vontade para se expressarem, mascaradas por um nickname manhoso e por uma foto que nada tem a ver com elas. Uma expressão que, nove em cada dez vezes, vem em jeito de ataque - e nunca de elogio ou de reflexão.
A facilidade de acesso às plataformas digitais justifica parte deste fenómeno. Mais não seja, por ter amplificado uma tendência que estava oculta algures nos meandros da mente humana. Hoje, qualquer pessoa, em qualquer lugar, à hora que lhe der na telha, está à vontade para emitir uma opinião sobre qualquer assunto - sem que depois venham perguntar por algum tipo de diploma que o habilite a falar sobre ele. Peço ao leitor que não me interprete mal: o problema não está na liberdade de expressão, um direito que é inegociável. É mais provável que esteja na leveza com que são insultadas as mães dos árbitros ou com que são afixados cartazes com a frase “Vamos pôr fim aos tachos!”.
Dei voltas e voltas até ser capaz de encontrar uma explicação. Eis o melhor que consegui: as pessoas criticam tudo por, no fundo, terem o dom especial de serem especialistas em… absolutamente tudo. Mestres em política, em gastronomia, no cinema, no desporto e até na vida alheia. Mesmo que não tenham experiência prática em metade destes assuntos. E todos lhes devemos um agradecimento: prestam-nos diariamente um serviço público, de caridade, sem pedirem um tostão que seja. Desta reflexão decorre que talvez devêssemos considerar transformar a crítica numa profissão: os “critiqueiros”. Com direito a registo e a alguns benefícios. E, claro, a impostos.
Imagine o que seria da sua carteira se, por cada julgamento mordaz nas redes sociais, recebesse um pagamento. Se cada crítica gratuita de almoço de domingo puder servir para mais alguma coisa. A quantidade de opiniões estapafúrdias e sem qualquer fundamento a que os seus olhos e ouvidos seriam poupados. Estou convencido. E o leitor?