Os equívocos de uma assessoria mal-executada e o papel dos media
Vimos e ouvimos recentemente o Primeiro-Ministro (PM) afirmar que os auriculares dos jornalistas servem para que as redações lhes soprem perguntas. Não houve grandes dúvidas sobre o facto de se tratar de uma frase desastrada, que durante dias motivou gargalhadas entre a classe jornalística. Ultrapassada essa fase, mais do âmbito da anedota, cremos que a verdadeira questão é outra: como é que alguém, rodeado por profissionais de comunicação, cai num erro destes?
A comunicação política, quando funciona bem, é quase invisível. Mas quando falha, o estrondo é inevitável. Foi exatamente o caso. Os assessores de comunicação têm a missão de ajudar os políticos a comunicarem de forma eficaz e a evitarem erros que possam comprometer a sua imagem. O problema é que, aqui, o tiro saiu completamente pela culatra.
O que o PM disse não só revela um desconhecimento profundo do trabalho dos jornalistas, o que até se entende, como também indicia uma falha grave na preparação do discurso por parte da sua equipa de comunicação – o que é mais difícil de entender. Sendo normalmente as assessorias compostas por ex-jornalistas, neste caso é como se os próprios tivessem dado um passo em falso num campo minado. Como todos os assessores bem sabem, os jornalistas têm a função de questionar e de investigar, e não de receber ordens de uma sala de redação sobre o que perguntar. Essa ideia é não só infundada, como é também um claro desrespeito pelo papel da imprensa.
A boa assessoria de comunicação não serve apenas para evitar gafes ou para atenuar declarações infelizes. O seu papel vai muito para além disso: serve para construir uma relação genuína entre cada político e a opinião pública. As palavras, os gestos, as entrevistas – tudo deve estar alinhado com uma narrativa coerente e transparente, devidamente planeada. O bom assessor é como um maestro. Quando a sinfonia falha, ou o maestro falhou, ou o músico tocou ao improviso, como lhe deu na cabeça. Em ambos os casos, os danos podem ser profundos.
Num tempo em que a política é cada vez mais um jogo de perceções, a má comunicação pode ser fatal. Não se trata apenas do modo como se diz algo, mas também de evitar dizer o que não se deve. No caso do PM, o impacto foi imediato: os deslizes tornam-se tema de conversa, não pela profundidade das ideias, mas pela superficialidade dos erros.
Na verdade, o que se espera de uma boa comunicação é simples: que funcione. Que ajude a construir pontes, e não a levantar muros. Uma regra básica deve estar sempre presente: quando se fala, é preciso ter a noção de que as palavras, mesmo as mais simples, muitas vezes têm consequências.