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Cristina Louzada, GASC Mealhada: “procuramos sempre acolher com coração”


tags: Mealhada Categorias: Entrevista quinta, 21 novembro 2024

O Grupo de Ação Sociocaritativo (GASC) da Mealhada, pertencente à Unidade Pastoral do concelho, foi fundado há 40 anos com a missão de prestar auxilio aos mais frágeis e desfavorecidos. Desde a sua fundação, o grupo tem-se dedicado a apoiar famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade social, oferecendo não só apoio financeiro, mas também distribuindo bens essenciais como alimentos, roupas, medicamentos e produtos de higiene, sempre com amor e consciência dos benefícios da sua ajuda.

A ação do grupo vai além de assistência material; ele promove dignidade e solidariedade, valorizando cada pessoa que recebe ajuda e reforçando laços comunitários. Ao longo da sua existência, o Grupo expandiu suas atividades, criando parcerias com empresas, voluntários, e com o Banco Alimentar de Aveiro, o que possibilitou o alcance de ainda mais pessoas necessitadas.

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O compromisso do GASC Mealhada após quatro décadas, continua a ser uma luz para aqueles que enfrentam momentos difíceis. O Grupo fortalece sua missão em transformar vidas, promovendo um impacto positivo e duradouro na sociedade

No passado dia 9 de novembro, o GASC organizou um jantar solidário para angariação de fundos, onde estiveram cerca de 270 pessoas, inclusive o Bispo da Diocese de Coimbra, D. Virgílio Antunes. O jantar contou com o apoio de várias entidades, foi o caso do restaurante o Castiço, da Caves Messias e da Água de Luso. Carla Carvalheira, dona do restaurante Castiço, que ofereceu a comida, e membro do GASC, mostrou-se feliz com o resultado final deste jantar solidário: “foi um grande momento de amor e solidariedade. Sei quais são as dificuldades que as famílias que nós ajudamos passam e daí isto se tornar um evento tão importante.” Carla Carvalheira acrescenta: “para a realização do jantar tive fornecedores que se aliaram a esta causa, bem como a minha equipa de trabalho que se voluntariou para ajudar no jantar.”

Há quantos anos é presidente do Grupo de Ação Sócio Caritativo?

O Presidente do grupo é o Sr. Padre Rodolfo, eu sou coordenadora do grupo há cerca de 10 anos

Enquanto presidente de um Grupo como este quais são as suas principais responsabilidades?

Um grupo Sociocaritativo é constituído por vários voluntários disponíveis para dar o melhor de si aos outros. Mas para que esta missão seja possível é importante que seja um grupo coeso, onde haja relações saudáveis entre os vários elementos, como coordenadora é minha função estar atenta e promover esse bem-estar.

Depois enquanto grupo a principal missão é estarmos atentos e disponíveis para os mais frágeis. De que forma? 

Acolhendo sempre quem nos procura, de forma a que a pessoa em si, se sinta amparada e nunca sozinha, procuramos sempre acolher com coração. Neste acolhimento não pode haver muitos rostos, é fundamental que aqueles que nos procuram confiem em nós e para que haja esta cumplicidade cabe-me a mim conversar com quem nos procura sempre com ajuda do Sr. Padre.

Depois de escutar é importante dar resposta às dificuldades de cada um, damos uma primeira ajuda, a possível e imediata. Quando a situação assim o exige fazemos o encaminhamento para os serviços sociais no município local, segurança social e SNS.

Para que a ajuda material seja possível, cabe à coordenação gerir e assegurar o aprovisionamento sobretudo de bens alimentares, vestuário, roupas para casa e alguns móveis de primeira necessidade

Por quantas pessoas é constituído este Grupo?

Cerca de 18 voluntários efetivos, mas depois temos uma rede de voluntários que nos ajudam das mais variadas formas.

Como nasceu e quando, o Grupo de Ação Sócio Caritativo da paróquia da Mealhada?

 O grupo foi fundado há mais de 40 anos pelas mãos de uma Senhora Dona Aurora Leuschner na altura pertencendo à Comunidade São Vicente de Paulo. Posteriormente passa a estar associado à Cáritas e passa a chamar-se GASC- Grupo de Ação Sociocaritativo da Paróquia da Mealhada. Nos dias de hoje ainda fazem parte elementos que estiveram na génese do grupo, Lurdes Santos, Emília Almeida e José Marques Santos.

Qual a vossa missão?

A nossa missão é sempre ajudar. Ajudar pressupõe o lema dos quatro «Ps»: Primeira, Próxima, Possível e Permanente, como nos ensinou o Sr. Padre Rodolfo.

Primeira porque como dependemos só de nós mesmos, podemos prontamente resolver, quase na hora, as primeiras necessidades. Próxima, no sentido de estarmos atentos, porque vivemos ao lado dos mais frágeis, e como cristãos temos que ser rosto deles. Possível, na medida em que os recursos dos grupos sociocaritativos são escassos e dependem, na sua totalidade, da generosidade das comunidades e dos que em nós confiam. Permanente - e esta talvez a mais importante –, porque sabemos que é um caminho longo, mas nunca desistimos de ninguém.

Pertencer a este grupo pressupõe um crescimento interior e espiritual, enquanto ser humano, enquanto cristão e enquanto grupo. Por isso, é importante que o grupo esteja em constante aprendizagem acerca do que é verdadeiramente a Caridade, missão que faz parte de nós enquanto cristãos, essa aprendizagem faz-se no contacto pessoal com os mais frágeis, com aqueles que a determinado momento das suas vidas se deparam com dificuldades materiais, angústias, medos, rejeições… e cabe-nos a nós enquanto igreja estarmos disponíveis para os acolhermos a todos sem reservas nem condições.

É nossa missão proteger o que há de mais íntimo e pessoal de cada ser humano, a sua integridade e dignidade, apesar das carência e dificuldades que possa viver.

 

Quais são os principais valores que orientam o vosso trabalho?

Somos Igreja, e citando o Papa emérito Bento XVI, na Carta Encíclica, «Deus é Amor»: “...a igreja nunca poderá ser dispensada da caridade, enquanto atividade organizada dos crentes, como aliás nunca haverá uma situação onde não seja precisa a caridade de cada um dos cristãos, porque o ser humano, além da justiça, tem e terá sempre necessidade do amor”.

O principal valor é o Amor Não existe amor sem confiança. Aquele que se encontra, numa situação de fragilidade, é importante que sinta em nós um porto de abrigo, que confie; é importante que independente de qualquer que seja a sua situação, sinta que connosco, Igreja, nunca se sentirá só, abandonado.

Não desistimos, estaremos sempre, com as nossas fragilidades próprias de grupo, procurando a ajuda para todos, dando sempre o melhor de nós e, acima de tudo, deixando que Deus através de nós atue.

Para que esta intimidade, esta confiança mútua possa existir, não permitimos a exposição pública a que ultimamente nos habituámos a ver nas redes sociais.

Que tipo de apoio prestam?

Apoio material, bens alimentares e alguns bens de higiene pessoal, vestuário e calçado, enxovais para bebé, incluindo carrinhos, alcofas, banheiras, camas, fraldas…bens para as habitações (móveis, loiças, todo o tipo de roupas para casa). Apoio económico (pagamentos de medicação, rendas, prestações de casas, luz, água e outros bens essenciais). Apoio psicológico, ajuda na procura de emprego, procura de habitação, acompanhamento na reestruturação familiar…

Quais são necessidades mais constantes?

Alimentação, pagamento de medicação, pagamento rendas de habitação, luz, água, mobiliário.

De que forma têm conhecimento dos problemas e necessidades das pessoas?

A comunidade sabe da nossa existência, o passa palavra é muito importante. Depois como já referi, estamos todos os dias no meio da comunidade, há um contacto de telemóvel só do grupo, mas as pessoas têm o contacto do Sr. Padre e o meu e sabem que do outro lado há sempre alguém que o vai ouvir e lhes vai dar uma resposta. Todas as semanas na nossa sede há um dia na semana em que há voluntários a organizar e fazer triagem de todos os bens que nos vão sendo doados pela comunidade, as pessoas já têm essa informação e aparecem naturalmente quando precisam de nós

Como é que angariam bens e dinheiro para oferecer às pessoas?

O GASC Mealhada é sócio do Banco Alimentar de Aveiro, e como tal tem as famílias inscritas e recebe alimentos correspondentes às famílias inscritas. Como sócio do Banco Alimentar é da responsabilidade do grupo a organização e coordenação da próxima recolha do Banco Alimentar no concelho da Mealhada nos próximos dia 30 de novembro e 1 de dezembro nas grandes superfícies comerciais. Convém salientar que os bens recolhidos nestes dois dias vão diretamente para Aveiro para depois serem distribuídos por todo o distrito.

Porém ao longo do ano são-nos doados muitos bens alimentares e de toda a natureza pela comunidade, que tem sido muito generosa. Algumas empresas nossas parceiras costumam fazer-nos donativos em dinheiro, bem como toda a comunidade.

 

Quem quiser fazer um donativo como deve proceder?

Aceitamos, com muita gratidão, toda a espécie de donativos, sempre de forma legal e transparente, mas também sempre com a maior discrição e com a garantia de não condicionar a nossa forma de agir.

Podem entrar em contacto com elementos do grupo ou contactar o telemóvel do grupo 939240441.

Todos os dias ouvimos notícias de que o rendimento mensal das famílias não é suficiente para suprir as necessidades. Esta insuficiência tem sido visível no concelho da Mealhada?

Tem sido muito visível a todos os níveis, pessoas que deixam de fazer a medicação porque não conseguem pagar os medicamentos, famílias que não conseguem pagar as rendas porque houve um aumento substancial das mesmas e por último a alimentação onde se sentiu uma grande inflação.

Ainda existe quem tenha de vergonha de pedir ajuda por ter receio de que se ‘saiba’?

Pedir ajuda não é vergonha, mas a nossa sociedade ainda não está preparada para ajudar sem julgar. Na maior parte das vezes, estes homens e mulheres não conseguem o seu espaço na sociedade, ou por vergonha, a chamada «pobreza escondida», ou porque não querem a exposição mediática a que se vêm obrigados, quando recorrem aos serviços públicos, ou ainda simplesmente porque não se enquadram nos requisitos impostos pela burocracia existente.

É necessário que aprendamos a ouvir, a ser pacientes, a não ser invejosos, a não nos envaidecermos quando ajudamos os outros, a não ser inconvenientes, a medir as nossas palavras e a pensar sempre: «e se fosse eu?».

É necessário que aprendamos a não julgar, mas sim a encontrarmos sempre uma forma de auxílio, sem nunca nos substituirmos às obrigações dos organismos estatais.

Realizaram um jantar solidário de angariação de fundos, no passado dia 9 de setembro, onde estiveram perto de 300 pessoas. Já estavam a contar com tanta gente? A nível de angariação de fundos, atingiu as vossas expetativas?

Sim, ficamos sempre surpreendidos porque atravessamos uma grande crise, mas por outro lado confiamos sempre na nossa comunidade. Quando fazemos apelos de ajuda, seja de que natureza for, sentimos que confiam em nós e mais importante que estão sempre prontos a ajudar, compreendendo a nossa missão, excedendo sempre as nossas espectativas.

Que tipo de eventos vão realizar no Natal que se avizinha?

A realização de eventos para angariação de fundos só é programada quando o grupo tem necessidade, neste momento com o jantar solidário conseguimos a estabilidade financeira para os cabazes de Natal e ajuda nas contas. Sentimos que o momento que atravessamos não se ajusta para que estejamos outra vez a pedir ajuda à comunidade.

Quais são os vossos principais desafios?

O principal desafio é não deixar ninguém para trás, não desistir de ninguém, seja qual for a causa da sua fragilidade. Nada realizamos para alcançar outos fins que não a ajuda verdadeira, mas sem nunca deixar a visível a nossa fé e o nosso ser Igreja. A maior felicidade para nós, Grupo Sociocaritativo, é viver cada momento de coração, com amor e liberdade, olhando com confiança e esperança para o futuro daqueles que de nós se aproximam.

Quer partilhar algum caso que por algum motivo a tenha marcado?

Já muitas situações marcaram e ficaram no meu coração, umas mais que outras, mas peço desculpa, mas não vou partilhar, estaria a defraudar quem confia em nós e própria a essência do grupo.

Em junho deste ano foi criado o Secretariado Diocesano da Pastoral Social e Caritativa da Diocese de Coimbra, da qual faz parte, de que forma é que pode melhorar ainda mais o apoio que Grupo de Ação Sócio Caritativo já presta?

Como referi o grupo está em constante aprendizagem, partilhar com outros grupos as nossas vivências, ajudar se for possível outras paróquias da diocese que ainda não tenham conseguido esta maravilha que é ter e pertencer a um grupo desta natureza, e perceber que verdadeiramente somos nós mesmos, que humildemente crescemos interiormente e somos privilegiadamente ajudados a ser gratos à Vida.