Sob o pretexto da liberdade e do direito de escolha, as democracias vão abrindo caminho para que figuras autoritárias entrem pela porta da frente, se sentem no topo da mesa, se banqueteiem que nem abades e depois, como se já não bastasse, se instalem confortavelmente no sofá do dono da casa.
Eleição após eleição, vemos líderes com ares de salvador serem eleitos. Em nome do povo, como sempre, com uma pitada generosa de promessas populistas. Todos conhecemos o discurso: desfazem uns, afastam outros, polarizam entre “os de cima” e “os de baixo”, “os bons” e “os maus”, “os de bem” e “os bandidos”. Falam de corrupção, sem cessar e por toda a parte - sempre sobre a casa dos outros, jamais na deles próprios.
Vejamos o que aconteceu na Hungria. Viktor Orbán, um reformador democrata, assim que se viu na poltrona, desmantelou instituições, limitou a imprensa livre e redesenhou a estrutura eleitoral. Com o sempre presente propósito de garantir o domínio político, custe o que custar, doa a quem doer. É muito simples: reduzem o elenco, apagam algumas luzes e, voilà, o espetáculo é exclusivamente deles, à sua maneira.
O mais irónico é que estas figuras fazem o que fazem em nome da “vontade popular”, legitimamente, com a conivência de pessoas cujo único pecado é a ingenuidade. Mais: essa ingenuidade, para mal de todos nós, reflete-se no apoio cego a soluções que parecem fáceis, mas que ocultam um retrocesso tremendo nas liberdades e nos direitos fundamentais. O que muitas vezes é vendido como “segurança” e “estabilidade”, não mais é do que o preço da repressão e da manipulação da verdade.
O remédio mais óbvio reside na educação cívica e política - antes que seja tarde demais, antes que nem sequer possamos pensar em remédios. Urge ensinar os cidadãos a reconhecer o lobo em pele de cordeiro, a questionar promessas e a desconfiar dos discursos que oferecem soluções fáceis e rápidas - ou seremos cúmplices do desmantelamento da democracia. De outra forma, estaremos condenados a que democracias não mais sejam do que um intervalo entre ditaduras.