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O Mundo de Trump


tags: Marília Alves Categorias: Opinião segunda, 27 janeiro 2025

Donald Trump regressou à Casa Branca, no passado dia 20 de janeiro, como o 47.º presidente dos EUA e, apenas, o segundo na História do país a ser reeleito para um segundo mandato não consecutivo (não acontecia desde Grover Cleveland, no século XIX).

A sua eleição traduz a vitória da democracia, no seu lado mais tenebroso, mas, ainda assim, legítimo. Populista, soube aproximar-se de uma maioria de americanos insatisfeitos, deserdados da globalização, receosos da imigração, incomodados com o novo “melting pot”, e, sobretudo, revoltados com o sistema, o qual foi diabolizado por si e que, agora, vai presidir.

A todos esses, Trump prometeu tornar a América grande, outra vez. Numa entrevista recente à Fox News salientou: “Não conhecia ninguém (durante o meu primeiro mandato). Não era uma pessoa de Washington. Raramente estava lá”. “Conheço toda a gente (agora). Conheço os bons, os fortes, os fracos, os estúpidos. Conheço toda a gente. E vamos tornar este país grande de novo, e temos de salvar o nosso país”.

Líderes populistas, como Donald Trump, trabalham arduamente para destruir a velha ordem económico-política. Esta velha ordem tinha os seus defeitos, mas também produziu as maiores melhorias no bem-estar humano alguma vez registadas no Ocidente, designadamente a diminuição dramática da pobreza e a Paz.

Agora que populistas como Trump estão no controlo, não parecem ter qualquer ideia do que deve substituir a velha ordem. Como resultado, o caos pode espalhar-se. A antiga ordem baseava-se em regras e valores universais partilhados. As fronteiras eram respeitadas e a soberania dos países também, colaborando na regulamentação do direito internacional, de forma geral e abstrata, com vista a promover a boa convivência entre povos.

Os populistas rejeitam todas as regras e valores universais, querem ver um mundo compartimentado e colocar as culpas das falhas nos outros, não na sua falta de visão política universal. E, sem regras e valores partilhados, como podem as nações rivais gerir pacificamente as suas divergências? Estamos aparentemente a caminhar para um mundo fracionado, conflituoso e, tendencionalmente, pior para os mais pobres. Receio que acontecimentos como a invasão russa da Ucrânia se tornem a nova norma, aliás Trump já começou por apregoar o uso da força para adquirir territórios soberanos. E, no novo mundo de Trump, caótico, não há disponibilidade para a Humanidade, de forma harmoniosa e global, evoluir.

Elon Musk, o homem mais rico do mundo, um visionário obcecado por dinheiro, dono de um império tecnológico, foi promovido a grande conselheiro de Donald Trump, depois de financiar parte da sua campanha. Agora, outro magnata Mark Zuckerberg, da Meta, rendeu-se também a Trump com vista a ganhar poder de influência para se livrar de impostos e ações judiciais em curso. Sem esquecer que juntos Musk e Zuckerberg controlam boa parte das redes sociais do planeta, as quais, tendo em conta as suas características, são suscetíveis de dominar uma grande parte das mentes menos informadas do mundo. Sem esquecer decisões sobre o desenvolvimento de novas tecnologias, designadamente a Inteligência Artificial, que não devidamente regulamentada será perigosa até para a Humanidade.

A única hipótese de conter os gigantes e proteger os próprios interesses é através da cooperação. Portugal tem sorte, porque já faz parte da União Europeia, que possui os recursos financeiros, tecnológicos e culturais para ser independente no mundo e para conter os EUA e a China. Mas só se os países da União Europeia se mantiverem unidos.

Atualmente, há demasiados líderes europeus populistas – e permeáveis ao poder económico que essas pessoas têm – a trabalhar para minar a unidade e a eficácia da União Europeia, no seu próprio interesse pessoal. Por si só, um país como Portugal é demasiado pequeno para se manter independente em qualquer circunstância, para ter algum futuro só o pode fazer se integrar organizações coletivas e juntarem os seus recursos.

Se os populistas tiverem êxito, o mundo não será mais o mesmo que conhecíamos até ao final do ano passado. Será muito mais perigoso, dominado por governos de extrema direita, sem mediação entre capital e trabalho, sem direitos fundamentais. Será um retrocesso civilizacional, com a destruição das democracias ocidentais como as que conhecemos hoje.