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Celebração dos 350 anos da primeira gravura da Mealhada dá origem ao arquivo digital do município


tags: Mealhada, Mealhada, Mealhada, Arquivo, Fotografias, Mealhada Categorias: Cultura domingo, 03 março 2019

Desde o dia 27 de fevereiro que o Município da Mealhada disponibiliza publicamente, através do arquivo digital (arquivo.cm-mealhada.pt), um acervo fotográfico da Mealhada de “ontem”. Este novo serviço é disponibilizado pela autarquia graças à doação do espólio fotográfico da Mealhada antiga, de José Branquinho de Carvalho, ao Arquivo Municipal.

“A ideia é a de que o cidadão não tenha que se deslocar fisicamente ao Arquivo para estudar ou trabalhar sobre uma imagem”, explicou Nuno Canilho, vereador da Câmara Municipal da Mealhada com o pelouro da cultura, no âmbito da palestra “Mealhada 350 anos em Imagens”.

Celebração dos 350 anos da primeira imagem da Mealhada estende-se até ao fim deste mês

Este serviço, surge no ano em que a Mealhada celebra os 350 anos da primeira imagem da cidade, concebida no dia 24 de fevereiro por Pier Mari Baldi, ilustrador da corte de Cosme de Médicis III. Este ano, nesse mesmo dia, a autarquia convidou o grupo “Urban Sketchers”, um conjunto de artistas que percorrem o mundo para retratar os locais por onde passam, para fazer uma visita à cidade, fazendo o respetivo desenho à luz do século XXI. Porém, as celebrações tiveram início no dia 23 de fevereiro, com a inauguração da exposição fotográfica “Mealhada 016 – Metamorphosis da Imagem Urbana”, coordenada pela fotógrafa profissional Cristina Casotto.

Na exposição coletiva de fotografia, que estará patente ao público até ao fim deste mês na Biblioteca Municipal da Mealhada, os visitantes podem encontrar a Mealhada de “ontem” e de hoje, sendo que as fotografias que revelam a Mealhada antiga pertencem ao espólio de José Branquinho de Carvalho e as que mostram a evolução dos dias de hoje são fruto de um curso de fotografia levado a cabo, em 2016, por Cristina Casotto, que lançou o desafio aos formandos de tirar fotografias no mesmo espaço retratado nas fotografias antigas. Branquinho de Carvalho explicou que esta exposição pretende “reproduzir mais ou menos a evolução do concelho nos anos”, com “imagens que não têm ligação umas com as outras, ou seja, são todas da Mealhada mas não têm ordem para serem vistas, correspondem apenas ao ontem e hoje”, que deve ser apreciado de cima para baixo, porque a ”fotografia antiga está a nível superior e a atual no inferior”.

O último grande evento celebrativo aconteceu no passado dia 27 de fevereiro, na Biblioteca Municipal da Mealhada, onde estiveram reunidos José Branquinho de Carvalho, fotógrafo doador, Nuno Canilho e António Breda de Carvalho, professor e escritor mealhadense, para falar sobre a primeira imagem da Mealhada, que permite olhar para a cidade de uma “perspetiva histórica”, segundo afirma Nuno Canilho.

Adelino Melo dá a conhecer a gravura de Pier Mari Baldi à Mealhada

António Breda de Carvalho foi o primeiro a tomar a palavra para dar a conhecer a figura de Adelino Melo, um vacariense que desenvolveu carreira como jornalista, transformando-se no ”decano da imprensa do concelho”, pelos vários títulos que publicou e pelo sucesso de 33 anos do jornal “Bairrada Elegante”. Homem a quem se deve também o conhecimento da primeira imagem do concelho.

José Branquinho de Carvalho atesta que é a Adelino Melo que se deve o conhecimento da ilustração feita a carvão do “burgo da Mealhada”, citando do livro do jornalista, “A Minha Carteira”, onde se encontra uma carta enviada por António Gomes da Rocha Madail, conservador do Arquivo e Museu de Arte da Universidade de Coimbra e diretor do Arquivo do Distrito de Aveiro, a Adelino Melo: “Senhor Adelino Melo, com muito prazer envio a fotografia pedida da velha Mealhada”. Na mesma carta é também referida a proveniência da imagem, “a obra de onde foi reproduzida é um álbum de gravuras que completa o livro “Diário Cosme de Médicis – Espanha-Portugal (1668-1669) ”, que, em 1993, foi publicado pelo Centro de Estudos Históricos de Madrid, “no arquivo da Universidade de Coimbra existe, oferecido por meu intermédio (de António Madail), um exemplar desta edição espanhola. Daí se reproduziu, portanto, a gravura da Mealhada que junto”.

Do ponto de vista de Branquinho de Carvalho, a imagem concebida por Pier Mari Baldi foi feita “a partir do sítio onde hoje se encontra a Capela de Santa Ana, uma vez que o desenho é visto de cima”, no entanto “ele não pode ter estado só ali em cima porque ali há casas que só poderiam ser vistas da parte de trás”. “Ele terá caminhado um pouco para Norte, para depois fazer aquele desenho”, acredita Branquinho de Carvalho, acrescentando ainda que “quem fez aquele desenho pode ter tido necessidade de fazer outros, para depois fazer um desenho do conjunto, dos bocadinhos que foi fazendo em pormenor”.

“É a memória histórica que temos de que a Mealhada é uma terra antiga”, Nuno Canilho, vereador da Câmara Municipal da Mealhada com o pelouro da cultura

Para Nuno Canilho, a gravura desenhada a 24 de fevereiro de 1669 “é a memória histórica que temos de que a Mealhada é uma terra antiga”, sendo por isso razão para celebrar, mais do que a passagem de Cosme de Médicis III, que nada fez pela Mealhada, para além de proporcionar, por meio do seu ilustrador, a primeira imagem da cidade. O vereador municipal considera que a imagem de Pier Mari Baldi é “a maior e melhor evidência de que a Mealhada não é uma terra do século XX ou do século XIX, é uma terra do século XVII, que tinha 50 casas e que era um ponto de passagem de peregrinos, tal como Cosme de Médicis que ia a caminho de Santiago de Compostela”.

É, então, num “espírito de divulgação cultural e historiográfica”, segundo Nuno Canilho, que surge o arquivo digital do Município da Mealhada. Dora Matos, responsável pelo Arquivo Municipal, referiu “a partir de hoje (27 de fevereiro) vamos começar a partilhar a documentação que já temos tratada”. Neste momento estão já disponíveis 200 fotografias devidamente legendadas, pertencentes ao fundo Branquinho de Carvalho, estando para publicar mais de 13 mil imagens digitalizadas, que carecem de contextualização e legendagem.

Arquivo digital surge num “espírito de divulgação cultural e historiográfica”

O vereador da cultura da Mealhada revela que “há milhares de fotografias muito importantes e muito relevantes que precisam de ser legendadas”, fazendo menção, inclusivamente, à compra, por parte da Câmara Municipal, de um conjunto de negativos a um fotógrafo de Coimbra, no qual lamenta, por exemplo, que haja “fotografias de casamentos de quem nem sequer sabemos quem é”. “Estas fotografias não valem nada se não forem descodificadas. Interessa-nos pouco ter uma fotografia que a gente não sabe onde é, nem de quem é”, remata.

Para solucionar a ausência de informação, Nuno Canilho lança um desafio à população, “se algum dos senhores ou alguma das pessoas que conheçam quiserem, um dia, prestar um grande contributo à Mealhada é dirigirem-se ao arquivo e verem se no conjunto de fotografias que lá estão há alguma coleção de alguém que conheçam”.

Dora Matos referiu ainda que o arquivo “sobrevive muito às custas das doações generosas de muitas pessoas que têm acervo em casa e que nos disponibilizam, nem que seja para digitalização”. A responsável pelo Arquivo Municipal lembrou o incêndio do século XIX como causa da eliminação de grande parte da informação, “de arquivo histórico não temos basicamente nada. Dos anos 20 aos 80 a única documentação que temos são atas municipais, jornais, nomeadamente, o “Jornal do Centro” e o “Sol da Bairrada”, este último cedido por António Carlos Andrade, e imagens doadas pela população”, garantiu. Por isso, Dora Matos lança um outro desafio à população, “quem tiver fundos, imagens ou documentos, agradecemos a doação ao arquivo municipal”.

 

Fotografia: Da esquerda para a direita: José Branquinho de Carvalho, fotógrafo doador, Nuno Canilho, vereador da Câmara Municipal da Mealhada com o pelouro da cultura, e António Breda de Carvalho, professor e escritor mealhadense.